
"Zagueiro é para zagueirar"! Na opinião do técnico Luis Felipe Scolari, ao zagueiro cabe defender a sua área, mesmo que para isso necessário se faça que se desse um bico na bola. A tese de Scolari reafirma verdade elementar: cada um deve saber com clareza a responsabilidade que tem e agir de acordo. Ao analisar a presente realidade, entretanto, é se induzido a concluir que existe preocupante descumprimento desta fundamental postura. São muitos os cidadãos que desconhecem ou simplesmente ignoram o comportamento que lhes cabe seguir. Aponto, como referência, recente fato de repercussão nacional: a invasão da torcida corintiana no CT do time, inconformada com a aparente apatia dos jogadores em campo. Recorrendo ao terror físico e psicológico, este grupo extrapolou sua paixão pelo time. Legítimo é fazer pressão, sem dúvida, mas dentro da civilidade, respeitando propriedade e privacidade. Torcer é apoiar não intimidar! Fato outro desagradável ocorreu no campo doméstico da minha paróquia. Num sábado desses, ouço barulhos incomuns na frente da igreja. Imaginei tratar-se de pedreiros mexendo com caçambas de entulhos. Como, no entanto, o barulho persistisse além do razoável, decidi conferir. Topo com quatro rapazes praticando skate usando como pista as rampas e o corrimão de acesso à igreja! É de estarrecer esta completa ausência de noção do espaço que estava sendo usado para semelhante diversão e por jovens adultos de quem se espera já possuir um mínimo de noção e responsabilidade!
Fatos como estes explicam por que a sociedade anda tão perplexa: as pessoas estão simplesmente perdendo a noção de quem são e do que delas se espera! Estamos nos nivelando por baixo! Aumenta o número de cidadãos, mormente entre crianças e jovens, que está perdendo a noção do que é comportar-se, do respeito devido aos outros e da educação compatível aos diversos espaços. O comportamento é linear, pouco importa se o sujeito está na igreja ou no clube! Leva-se lanche para as crianças, tanto faz se o destino é a igreja ou o jardim da praça! E se alguém ousar orientar ou chamar atenção é logo taxado como intruso, exigente, mandão. Já vi pais sentindo-se ofendidos, considerando-se agredidos e insultados porque lhes foi solicitado corrigir o comportamento inconveniente dos filhos! Imaginando granjear a simpatia dos pequenos e não melindrar sua delicada autoestima, muitos pais e educadores estão simplesmente abrindo mão de passar orientações de conduta e exigir seu cumprimento. Criança não pode ser tolhida, dizem, nem sentir-se cerceada em sua liberdade! E o que se diz valer para as crianças passa-se, igualmente, a valer para todo mundo. Cada cidadão, hoje, define o comportamento a adotar, não importa se isso incomoda os outros ou lhes provoque transtornos. Modos e educação são valores considerados ultrapassados, caretas. O negócio é ser moderninho, isto equivale a desconhecer limites, desprezar a etiqueta, desrespeitar a particularidade dos espaços.
O que está se esquecendo, ao defender esta ambígua liberdade, é que o cidadão, ao perder a noção de quem é e a do que dele se espera, se desqualifica. Ao contrário do que se apregoa, o sujeito não se afirma, se descredencia. Age como peça fora do contexto. Deslocado, naturalmente fica desorientado, com consequências negativas para si e para os outros. O caos fica inevitável quando esta mentalidade passa a ser aceita com a complacente anuência da sociedade ou da sua cúmplice omissão. O preceito da caridade cristã e a consciência cívica exigem que a sociedade, através de suas instituições e de seus agentes, reaja e lute para reverter este processo de desintegração. É obrigação inalienável instruir e formar para a cidadania. Quando se ajuda a pessoa a formar correto conceito acerca de quem é, da sua individualidade e de suas intransferíveis responsabilidades na sociedade, presta-se-lhe o bem maior e, à coletividade, um inestimável serviço. Descobrir qual é seu lugar certo e a ele saber corresponder é a realização maior no plano individual e coletivo!
Esta reflexão já estava alinhavada quando os jornais publicaram fotos do vice-presidente do Congresso Nacional tratando grosseiramente o presidente do Supremo com gestos e escritos insolentes! Lamentável registro que apenas comprova que quando o sujeito perde a noção da posição e do lugar que ocupa, as consequências, invariavelmente, serão lamentáveis e desastrosas.
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