
"Rezaremos pela paz"! Foi o apelo que o Papa Francisco dirigiu aos chefes dos Estados de Israel e da Autoridade Palestina em sua marcante visita ao Oriente Médio. Pronta e diplomaticamente ambos os presidentes aceitaram atender ao apelo do Papa. Ao oferecer sua residência para o encontro, o Papa parece visar um encontro íntimo, de oração mesmo, distante de discursos e posturas protocolares que costumam render fotos e manchetes, mas ralos resultados práticos. A aceitação imediata das lideranças não deixa de ser positivo agouro. Acena para sinceros sentimentos de superação de conflitos. Emerge a angustiante indagação: por que é tão difícil haver paz, justamente em Jerusalém, a cidade da Paz? Supremo paradoxo, a cidade reconhecida sagrada por judeus e muçulmanos vive em constante tensão!
É difícil entender o conflito sem inteirar-se da complexidade da realidade, com reflexos na consciência dos dois povos. Judeus e palestinos consideram sua a região por direito. Os judeus inspiram-se e apóiam-se nos livros sagrados. Registrado está solenemente na Bíblia que Deus não somente lhes deu aquela terra como herança, como também participou ativamente para ali instalá-los. Inúmeros são os textos sagrados que confirmam esta doutrina. Não se pode esquecer que para os judeus religião e nacionalismo se confundem. Assim, o símbolo maior da soberania judaica é o Templo, construído primeiro por Salomão e reconstruído após o exílio babilônico. É perceptível o sentimento patriótico quando o judeu refere-se ao Templo, e não precisa ser judeu praticante! O Templo representa a morada de Deus, não somente em sentido espiritual, mas igualmente em sentido cívico e nacional. Deus é o único soberano da nação judaica! Ora, com a destruição do segundo Templo pelos romanos os judeus foram obrigados a fugir e se dispersar pelo mundo. Sem, porém, nunca superar a saudade da terra, daquele pedaço de chão que, por direito divino, consideram próprio.
Enquanto estiveram os judeus dispersos pelo mundo, o local não ficou desabitado. Nativos o ocuparam e ali residem há séculos. Como desalojá-los por decreto? A história registra, primeiro, a invasão bizantina, cristãos ortodoxos, que impulsionados por sentimentos piedosos, ocuparam a região e construíram igrejas e mosteiros nos supostos lugares frequentados por Jesus. O local, obviamente, transformou-se rapidamente em destino para peregrinações. Surge, então, no séc. VII, Maomé, apresentando-se como o mais autêntico profeta divino. Aproveitando-se do ambiente místico da cidade de Jerusalém, Maomé a escolhe como a sua derradeira morada. Os muçulmanos acreditam que foi de lá que Maomé foi arrebatado vivo ao céu. Assim, ao lado da igreja bizantina, que foi erguida onde antes havia o Templo, os muçulmanos ergueram uma mesquita para marcar o chão sagrado de seu profeta! A expansão do império Otomano, marcadamente muçulmano, busca impor sua hegemonia e conquista a região considerada sagrada por judeus e cristãos. Ao avançarem pela palestina, os otomanos destroem igrejas e as substituem por mesquitas, inclusive e principalmente no território onde ficava o Templo. Impõe-se ali, soberana, a mesquita da cúpula dourada, símbolo maior da pujança muçulmana. Simultânea e compreensivelmente, afronta maior ao brio judeu! O cidadão judeu não digere de forma alguma o que considera apropriação indébita e nem cogita desistir de lutar para reconquistar o espaço sagrado, local por Deus escolhido como sua habitação, centro de preces e peregrinações! Suaviza a amargura, com o acesso ao muro das lamentações, o alicerce que sobrou do segundo Templo.
A questão política se insere neste fervente caldo patriótico-religioso. Obviamente, outros fatores agravam e tornam ainda mais complexa a situação. É de se reconhecer, todavia, que ambas as partes defendem válidos argumentos. Reconhecer a legitimidade desses direitos parece constituir-se num fundamental passo na direção para um convívio civilizado. Dispõem-se, o Papa Francisco, o Presidente Shimon Peres e o Presidente Mahmoud Abbas, ao se prostrarem em oração, a ouvir, a atender e a colaborar com o mais profundo desejo do Deus-Amor, reverenciado por ambos os povos, fazendo a paz acontecer, naquele solo sagrado. Uma paz não apoiada em armas e bombas, mas alicerçada no respeito e na fraternidade entre os cidadãos. Paz para Jerusalém!
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