sábado, 13 de dezembro de 2014

LUTA POR ESPAÇOS

Fala-se muito em direitos. Particularmente, em tempos recentes, a sociedade contemplou uma espécie de surto de iniciativas por parte de vários grupos ditos minoritários reivindicando reconhecimento. Acompanhou a população, entre outras, a luta pelo direito da união civil entre homossexuais e, como corolário inevitável, o pleito pelo direito dos mesmos adotar ou mesmo gerar filhos, usando modernos recursos de fertilização. Mais recentemente, debate-se sobre o direito de escolher a hora da morte. O impacto que essas iniciativas inovadores exercem sobre a sociedade contemporânea é compreensível. A população, tradicionalmente conservadora, se vê assustada e confusa, incerta e receosa quanto aos desdobramentos possíveis de todos esses movimentos reivindicadores. A introdução desses reconhecimentos mexe, evidente, com o compasso da sociedade e provoca um sem número de questionamentos. A história pelos direitos humanos é antiga. Já na época do império romano, os estóicos tratavam do assunto. Formularam a doutrina que defende a existência de um código de conduta e tratamento humano, baseada no simples fato das pessoas serem gente. Partindo da premissa da universalidade da raça, os estóicos defendiam que todo ser humano, pelo fato de ser humano, possui direitos inalienáveis. No começo da Idade Média, o parlamento inglês também elaborou decretos que pretendiam defender o cidadão contra os caprichos da monarquia. Durante os anos sombrios da Idade Média, pouca importância foi dada a esses direitos, tanto pelo poder civil como religioso. O desrespeito e a prepotência das autoridades culminaram na erupção da revolução francesa que pretendeu entronizar o ser humano e assegurar como base de qualquer direito o tripé, liberdade, fraternidade, igualdade. Embora a doutrina fosse reconhecida como válida, sua aplicação foi manipulada segundo o gosto da autoridade em exercício. Arbitrariedades não faltaram. Finalmente, a Assembleia Geral das Nações Unidas, recuperando-se das feridas da Segunda Guerra, em 1948, conseguiu formular uma Declaração de Direitos Universais do ser Humano. Repara-se que o conjunto de propostas ficou definido como declaração, perdendo o peso de um estatuto que obrigasse os signatários a observar suas disposições. Nesta condição de Declaração, o conjunto é propositalmente poroso, admitindo dúbias aplicações. Significativo também lembrar que o único país a não assinar a Declaração foi a então União Soviética. Este pequeno histórico ajuda a entender que a luta por direitos sempre esteve inerente à marcha da humanidade. A liberdade, na verdade, é um dos mais nobres e inalienáveis predicados da condição humana. E o direito de garantir o próprio espaço é consequência óbvia da liberdade. É justamente aí que começam os conflitos e emerge a imperiosa necessidade de formular códigos de comportamento capazes de assegurar digno espaço para as várias tendências. A questão básica e intricada sempre é: a que fundamentos recorrer para estabelecer esse código? Que valores podem ser considerados verdadeiramente universais a ponto de garantir digno espaço para todos os vertentes e, simultaneamente, os obrigar a respeitar o espaço alheio? Na evidente dificuldade de conseguir consenso a respeito dessas básicas premissas, alguns sugerem o recurso à consulta majoritária para estabelecer espaços. O que a maioria decidir ficará estabelecido. A estratégia é evidentemente inconsistente, dada a flexibilidade e a suscetibilidade da opinião coletiva. Situações pontuais e de caráter predominantemente emotivo exercem influências consideráveis. Não é pelo fato de a maioria da população mostrar-se favorável a determinadas propostas que as mesmas passam a ter status de direito. O desafio persiste: encontrar princípios universalmente aceitos e que sirvam de base sólida para estabelecer direitos de indivíduos e de grupos. Fundamentos, aliás, que valem não somente para a esfera acadêmica, mas que prestam, igualmente, para moderar comportamentos. Que todos os segmentos tenham garantido seu espaço é salutar tendência na cultura moderna. O que não se tolera é um segmento impor como verdade absoluta suas preferências e, presunçosamente, achincalhar quem pensa diferente. Afinal, a liberdade de um termina onde começa a liberdade do outro. Direitos e espaços é questão de equilíbrio e respeito.

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