sábado, 12 de setembro de 2015

450 ANOS

“Não há nada tão conhecido como o assédio contra Malta”. A assertiva é de Voltaire e refere-se à grande batalha que ocorreu na pequena ilha de Malta entre as forças cristãs, na época e na ilha representados pelos cavalheiros de S. João, e as forças otomanas, lideradas pelo hábil e temível corsário, Dragut. A estratégica localização da ilha sempre foi cobiçada pelas forças marítimas dominantes. No século XVI, o império otomano, com sede em Constantinopla (atual Istambul), ambicionava impor-se em todo mediterrâneo e Malta, obviamente, representava base estratégica na busca do objetivo hegemônico. A ilha tinha acabado de ser oferecida como base aos cavalheiros hospitaleiros de S. João Batista, após uma fragorosa derrota em Rhodes. Os cavalheiros hospitaleiros formavam, originariamente, uma comunidade de enfermeiros a serviço das Cruzadas. Com o tempo acabaram se constituindo como os derradeiros defensores da cultura cristã. Formados por integrantes de famílias nobres da Europa, seguindo um regime quase monástico, dedicavam-se a lutar na defesa da fé cristã contra o otomano. Fica assim evidente que uma ambição meramente política, a de tornar o império otomano soberano no mediterrâneo, foi transformada, por conveniências estratégicas, em uma guerra de religiões: por um lado, o otomano muçulmano, por outro, os cavalheiros de S. João defendendo a Europa cristã. Na época, Elizabeth I, rainha da Inglaterra, deixou clara a apreensão reinante ao declarar que se Malta capitulasse em mãos otomanas ficaria muito incerto o futuro do cristianismo na Europa. Por sua vez, a armada conduzida pelo corsário Dragut andava cheia de valentia, afinal vinha de campanhas exitosas contra as forças cristãs, a mais notável sendo a de Djerba, perto da costa da Tunísia. A relativamente fácil vitória na ocasião, acabou se transformando, segundo os historiadores, em providencial salvação das forças cristãs na Europa. Ciente e confiante em sua superioridade, a frota turca postergou o cerco contra Malta, oferecendo aos príncipes cristãos tempo suficiente para reequipar-se e preparar-se para o inevitável confronto. Outro fator decisivo, foi a eleição do cavalheiro francês La Vallette, como Grão Mestre da Ordem. La Vallette mostrou-se ser destemido guerreiro e exímio estrategista bélico. Carismático líder, soube unir cavalheiros e nativos e em brevíssimo tempo construiu formidáveis fortificações para proteger a ilha. Sagaz, fez infiltrar na aramada otomana informantes que lhe passavam preciosos detalhes acerca de manobras e de articulações da frota inimiga. Ciente da iminência da invasão, La Vallette concentrou as defesas da ilha no grande porto, e fez com que toda plantação da ilha fosse previamente recolhida e armazenada. Cuidou igualmente de inviabilizar todos os poços artesianos, limitando drasticamente o abastecimento para o invasor. O assédio de fato, provou-se ser de proporções épicas, pois juntou mais de 30.000 otomanos contra, aproximadamente, 6.000 defensores, entre cavalheiros e ilhéus. Foram quatro meses de intensos conflitos, com inicial avanço otomano, a custa, todavia, de muitas baixas, inclusive do próprio Dragut. A morte do corsário e a intrépida liderança de La Vallette foram decisivos para a derrota final da aramada otomana, acontecida no memorável 8 de setembro, do ano 1565. Um monumento, erguido ao lado da catedral de S. João, a Igreja mãe dos cavalheiros, na capital da ilha de Malta, Valletta, obviamente dedicada a seu mais ilustre defensor e construtor, exalta a épica vitória. A escultura, obra do artista maltês Antônio Sciortino, expressa magnificamente o real sentido deste episódio para a história da ilha e da Europa. A figura central ostenta a figura do ilhéu, de peito desnudo e olhar determinado, segurando uma espada posta a frente de um escudo com a cruz dos cavalheiros de s. João. A seu lado direito, uma figura feminina representa a fé enquanto pelo lado esquerdo, outra figura feminina representa a deusa grega minerva, símbolo da sabedoria. Apoiada na fé e alimentada pela inteligência humana, a valentia do ilhéu e a bravura do cavalheiro defenderam a fé e a cultura cristã contra o ambicioso otomano. Há exatos 450 anos! Nenhuma força prevalece quando a fé e a razão se unem e em comunhão caminham!

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