
Alardeia-se o surgimento da cristofobia! Trata-se de um movimento que, ostensivamente, faz enérgica e sistemática oposição ao cristianismo, seus dogmas e suas tradições morais. Defende uma sociedade mais laica, liberta das tradicionais imposições religiosas e símbolos sacros, particularmente cristãos. Nada de novo, na realidade! Pelo que se observa, a campanha contra esse movimento laico esta sendo articulada por grupos fundamentalistas, tanto evangélicos como católicos. Esses grupos promovem círculos bíblicos e cultos ruidosos em lugares inusitados, como locais de trabalho e praças públicas, com o explícito intuito de exaltar a presença divina e defender a religião e os bons costumes. Geralmente, as suplicas refletem um moralismo tradicionalista, focado no erotismo e na lassidão de costumes, como se a maior perversão humana estivesse concentrada na manipulação das genitálias. A rápida ascensão desses movimentos indica, de um lado, salutar preocupação com a derrocada de costumes. Inegável é que a conduta das pessoas anda fortemente influenciada por um materialismo exacerbado e um erotismo vulgar e degradante. Por outro, emerge uma séria preocupação quanto a uma provável leitura ambígua da essência da religião, em particular da religião cristã. Receia-se, ainda, o ressurgimento da medieval mentalidade do patrulhamento de ideias e imposição de costumes.
É nos evangelhos, na ação e nos ensinamentos do Senhor Jesus Cristo, que se deve procurar a legitima fundamentação da proposta cristã. Desponta evidente nessa leitura, a constante preocupação de Jesus com uma religiosidade que se esgota na instituição e se concentra no culto. A leitura atenta do ensinamento de Jesus indica que o espaço mais apropriado para dar credibilidade à religião não é o templo, mas a praça. Não é o rito, mas a prática. Nessa prática, destaca-se com meridiana clareza a maneira como lidar com o irmão. Coerente e reiteradamente, Jesus insiste que não se pode amar e servir a Deus sem que se abra, com igual devoção, ao irmão. Chega a afirmar, em plena sintonia com os ensinamentos dos profetas, que o culto que mais agrada a Deus é a prática da misericórdia. Para Jesus, a reverência a Deus se confunde com o respeito para com o próximo. No cristianismo não há devoção a Deus sem que a haja a correspondente atenção ao semelhante. Se se quer, portanto, mostrar o vigor e a urgência da religião, é preciso estender a mão ao semelhante, prostrado com tantas agressões. Promover o Homem com diligência e genuína caridade é a maneira mais inteligente e eficaz de fazer frente ao materialismo e à lassidão de costumes que mantêm doente a sociedade.
O homem moderno encontra-se moralmente caído, e civilmente desprotegido, assaltado e agredido que é por tantos bandidos. Na leitura fundamentalista acima referida, projeta-se reverter esse processo decadente por meio de amplificadas manifestações e doutrinações. Ao cantar ruidosamente, e pregar com ardor busca-se reconduzir as pessoas ao caminho da salvação. A leitura atenta do evangelho mostra, contudo, que Deus é genuinamente glorificado quando se age como próximo do irmão caído. Jesus critica duramente os servidores do templo que de tão preocupados com suas liturgias, ignoram o irmão caído. Para estes, o caído permanece invisível. Destaca, contudo, como genuinamente religioso o herege samaritano que acode generosamente o desconhecido ferido. Este samaritano, e não os servidores do templo, testemunhou a real presença divina. Sua conduta continua interpelando até hoje! Em tempos críticos, de tantos irmãos caídos, nada é mais balsâmico que gestos de aproximação, generosos e despretensiosos. Mãos estendidas, em suma, que Deus aprecia quando feitos com caridade e, preferencialmente, longe de holofotes. Equivoca-se quem pensa anunciar Deus com ruidosos encontros e pregações fervorosas. O reino não vem com barulho de trombetas, mas acontece na ação silenciosa do fermento que leveda a massa. É nosso olhar que representa a mais convincente pregação.
Impressiona o respeito de Jesus pela liberdade individual. Em nenhuma circunstância ele se impõe. A opção para segui-lo deve ser sempre livre. A única cruzada, evangélica e evangelizadora, simples e acessível, contra a recorrente cristofobia, permanece a da mão estendida em direção ao esquecido. Antes de cerrar os olhos em louvores, é preciso mantê-los abertos para enxergar, acudir e levantar o irmão caído.
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