sábado, 2 de maio de 2015

TROMBETAS

Causa náuseas o noticiário sobre a corrupção. O absurdo volume de delitos impressiona pelas cifras e pela desenvoltura. Um notório líder político deu, recentemente, uma declaração carregada de cinismo. Ao referir-se ao grau de atrevimento praticado, afirmou: roubaram demais! Declaração que insinua que corrupção modesta o país tolera! Triste realidade, confirmada por um dos acusados de desviar milhões de dólares. Confessou candidamente o indiciado que comissões e superfaturamentos são regras implícitas no jogo das licitações. O que desalenta, na verdade, é o aparente estado de impotência que o cidadão sente diante de tanto acinte. Afinal, o governo não produz um único centavo. O caixa do país, qualquer país, é resultado da soma da arrecadação de impostos, ou seja, do dinheiro de cada cidadão. Recorrendo ao jargão jornalístico, é o seu e o meu rico dinheirinho que está sendo roubado. O que justifica plenamente a indignação. Enganamo-nos todos, porém, se continuamos a pensar que nada podemos fazer diante de tanta safadeza. Resignar-se é admitir irrecuperável derrota. Conformar-se equivale ao consentir com que a rapinagem continue. Na base da corrupção está o amor idolatrado pelo dinheiro e pelas evidentes vantagens que acompanham abastadas contas bancárias. O ex-presidente paraguaio Mujica comentou recentemente que quem gosta de dinheiro não pode ser político! A frase é de um impacto contundente, em especial, porque dita por quem conhece muito bem os bastidores da política. Como, todavia, o ser humano acalenta incurável sedução pelo dinheiro, induzindo-se a delirar que nunca cairá escravo do 'vil metal', entende-se porque a praga da corrupção se dissemina pelo mundo. A facilidade com que este difuso pecado se alastra motiva economistas e sociólogos a tentar explicar o fenômeno e, simultaneamente, propor mecanismos capazes de, pelo menos, reduzir os consideráveis prejuízos causados na vida e na cultura de tantos países pelo nefasto delito. Merece atenção a tese do professor Robert Klitgaard, notório estudioso do assunto. Ele explica a corrupção recorrendo à fórmula MPFE. Segundo o acadêmico a corrupção ocorre e cresce quando há Monopólio, aliado ao Poder discricionário. Monopólio e Poder discricionário, isto é, a dependência excessiva em uma autoridade/funcionário para conseguir liberação para o exercício de qualquer atividade, é situação propícia para gerar corrupção. A tentação de exigir suborno ou de fazer agrados para liberar ou conseguir determinadas autorizações é enorme. Como também enorme é o poder de sedução da estratégia. Segundo o economista, a presença desses dois fatores representa ideais condições para a prática de desvios. Quando junto ao Monopólio e ao Poder discricionário faltarem mecanismos confiáveis de Fiscalização eficiente e independente, o caminho para a efetivação da corrupção fica plaino e livre. Governos decentes e dirigentes responsáveis e bem intencionados cuidam em garantir a independência e a lisura dos mecanismos fiscalizadores. Quando, pois, os governantes insistem em interferir no trabalho dos órgãos fiscalizadores ou reservam para si a nomeação dos integrantes desses serviços, a probabilidade de acontecer negócios suspeitos e licitações fraudulentas aumenta enormemente. A concentração do poder sempre é suspeita e abusiva. Quem receia fiscalização sempre levanta desconfianças. Gente honesta prioriza transparência. É onde entre o E, de ética, na fórmula do Klitgaard. Quando se descartam princípios básicos de respeito pelo semelhante, quando se minimiza a responsabilidade cívica no cumprimento do dever, toda forma de gestão se torna lícita. Quando o referencial de conduta deixa de ser o respeito pela inviolável dignidade do outro e passa a ser a ambição, seja pelo dinheiro seja pelo poder, abdica-se de qualquer regra de controle, de qualquer conceito de justiça. Sem ética, o ser humano se transforma em prepotente déspota, em arrogante e inescrupuloso parasita. Sem ética as trombetas da catástrofe soarão. Ética se aprende em casa, na igreja. Sobre pais e líderes religiosos recai a grave responsabilidade de formar cidadãos decentes, de caráter, honestos! Honrados, enfim! A atual situação do país insinua reincidentes omissões e graves negligências. A hora não é de resignação covarde. Nem de estéril indignação. A hora é de reassumir responsabilidades e evitar que as trombetas soem!

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