sábado, 1 de agosto de 2015

ASPIRAÇÕES

ASPIRAÇÕES "Há algo de profundamente errado no atual estágio da humanidade". Precisa observação do escritor Tony Judt. Dispensam-se extensas pesquisas para confirmar a objetividade da afirmativa. De um lado, a inteligência humana realiza espetaculares avanços tecnológicos em praticamente todas as áreas da ciência. Do outro, a mesma inteligência humana não consegue resolver decentemente desafios como a fome, a situação de migrantes e refugiados. Custa entender esses descompassos no atual contexto da evolução humana. Dinheiro e matéria prima há de sobra. Basta conferir as ingentes somas desviadas em corrupção e o descarte de montanhas de alimentos, de remédios vencidos e de obras inacabadas. Desperdício que envergonha e afronta a mais elementar sensibilidade. Salta aos olhos indigesta constatação: falta decisão para resolver os graves problemas sociais. Protocolarmente, a população condena a fome. Governantes fazem discursos emocionados defendendo a causa da solidariedade. No entanto, quer a população como os governos estão com a cabeça em outras prioridades. O sofrimento de milhões de pessoas é trampolim demagógico e oportunista, não raramente usado como tapete para esconder sujeira. Está mais do que evidente que não é por caminhos oficiais que os dramas sociais serão resolvidos. As ambições das autoridades conflitam com as aspirações mais urgentes das populações. As carências sociais permanecem graves e demandam urgentes e objetivas soluções. Quanto mais se atrasa nesses encaminhamentos, mais dramática fica a situação. E mais dispendiosa a solução sob todos os aspectos. Premissa indispensável é conscientizar-se que nenhuma tensão social é limitada a classes ou regiões. Especialmente no atual mundo globalizado. A crise na Grécia, para citar apenas um exemplo da hora, está afetando as economias do mundo inteiro. Ninguém pode permanecer indiferente diante das atuais infames desigualdades e injustiças. Chega-se, então, ao âmago da questão: o que está dolorosamente errado na humanidade são as aspirações que motivam os cidadãos em direção ao progresso. Por natural instinto o Homem quer viver bem, mas está reduzindo esse legítimo ideal ao acumulo individual de bens materiais. É o grande equívoco no qual a atual cultura consumista e hedonista está caindo. Não existe felicidade exclusivamente individual. Nenhuma fronteira garante por muito tempo o bem estar de uma nação. Repara-se na tensão que diariamente desafia quem está bem de vida, tanto no campo individual como nacional. É constante a vigilância para defender o próprio patrimônio. Consegue-se conforto material, mas sem a liberdade, sem a feliz descontração de poder usufruí-lo. A conclusão óbvia: acúmulo individual de bens não garante felicidade. O bem estar, se não for coletivo e justo, não assegura a paz! O progresso só é consistente quando é partilhado! Ilusão imaginar poder enriquecer-se somente no vertical sem incluir o horizontal! Urge ajustar as legitimas aspirações de progresso e bem estar. Atitude primeira é corrigir o conceito de posse absoluta sobre qualquer bem. Nenhum bem é absoluta e exclusivamente pessoal, mesmo se adquirido com legítimo esforço. É preciso reconhecer que todo lucro deve ter desdobramentos coletivos. São conhecidos os abusos e as injustiças que se cometem a partir da ideologia da posse absoluta. Quanta destruição e quanto desperdício são causados quando alguém ou alguma instituição se porta como dona absoluta de algum bem! Danos irreparáveis e prejuízos incontáveis para inteiras populações são causados quando, por arrogância ou prepotência, alguém se autoproclama dono do pedaço. Há uma hipoteca social sobre todo e qualquer bem da terra. É a verdade social pétrea que nenhuma legislação precisa confirmar nem está capacitada a anular. Sendo fundamental, esta verdade atinge a todos os segmentos da sociedade. Anula-se, assim, outra difusa ambiguidade. Pensa-se que a hipoteca social atinge somente a classe abastada. Oportunista engano. Sobre todas as classes sociais e profissionais, inclusive as menos favorecidas, recai a mesma responsabilidade coletiva com idêntico peso moral e ético. Pobre também pode assumir ares de dono absoluto. Gente há que resiste dividir por considerar que o que tem é insignificante diante das necessidades do mundo! Responsabilidade social não é questão de quantidade, mas de mentalidade. De conscientização! O que está ficando ambíguo no atual estágio da evolução humana é que as aspirações particulares estão se sobrepondo aos anseios e direitos coletivos! A humanidade está ficando obcecadamente egoísta!

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