
Fé é política! Se não interferisse na promoção do bem comum, a fé ficaria desencarnada. Adorno alienante. Afinal, quem acredita em Deus acredita igualmente no ser humano. Com idêntica coerência com que acredita Jesus Cristo, a ponto de dar a vida pela humanidade. Demonstração maior de fé em Deus e no Homem, impossível! Essa é a razão, compreensível, porque Jesus insiste com seus seguidores que zelassem pelo bem-estar do semelhante. Um zelo completamente diferente do que demonstrado por um bom número de políticos ao redor do mundo. Curioso como os políticos de carreira se viciam rapidamente em demagogia. Fazem discursos comoventes e promessas solenes, e uma vez eleitos mudam os discursos, engavetam promessas e repetem os mesmos erros que veementemente condenavam.
É conhecida a dura censura que Jesus aplicava às autoridades do seu tempo, tanto religiosas como civis. Uma bandeira que lhe custou caro, alias. A crítica de Jesus, denuncia a manipulação costumeira praticada por políticos de carreira. Há um episódio nitidamente político no itinerário de Jesus a Jerusalém. Nesse caminho, que segundo os estudiosos é mais teológico que geográfico, o Mestre repetidas vezes se referia ao destino que o esperava em Jerusalém. Ao anunciar claramente esse destino, Jesus insinua nas entrelinhas que a sua condenação e subsequente imolação faziam parte do plano divino da redenção. É como se Jesus estivesse conclamando as pessoas a enxergarem alem das aparências. Ao entregar livremente, e por amor, sua vida Cristo convence que a redenção da humanidade passa pelo esquecimento de si em favor do outro. Este é o sentido sublime da morte na cruz. A cruz deixou de ser instrumento de infame tortura e passou a representar o sinal mais eloquente de amor-doação. Convenhamos, é difícil para o Homem, contumaz egoísta, assimilar esta logística. Mudanças radicais de conceitos se assemelham a um itinerário. Parte-se de um ponto avançando em direção ao destino desejado. Jesus via em seus discípulos a dificuldade em compreender e assimilar sua receita redentora. Paciente e repetidamente explicava a verdade oculta.
Escolados nos ensinamentos dos rabinos, os discípulos teimavam interpretar as assertivas de Jesus relacionadas à vitória final no sentido estritamente político. Nada de estranho, humanamente falando, que os discípulos vislumbrassem dias de glória e de ascendência política ao lado do Mestre. Afinal, se ele for o líder máximo neste tal reino, eles seriam, pela lógica, os primeiros integrantes da corte. Os futuros privilégios atiçavam o apetite ambicioso daquele humilde grupo. Ao perceber o equívoco, Jesus trata logo de colocar seus amigos na raia certa. Chama-lhes a atenção acerca da maneira que se faz política no mundo. Lembra-lhes que os políticos de carreira buscam sempre evidência a custa da dominação e da exploração. Denuncia com conhecimento de causa a categoria de políticos, e de outras lideranças, que usam autoridade e cargos para promover seus interesses mais que o bem-estar dos cidadãos. O pensamento desses políticos, segundo Jesus, não é promover a polis, o bem comum, mas, sim, acumular vantagens e privilégios embutidos no exercício do cargo. É comum, essas lideranças buscar perpetuar-se no poder. Recorrem para esse fim à corrupção, à manipulação dos fatos e ao domínio da informação, ao assistencialismo paternalista e ao medo. Jesus conhecia a nefasta cartilha da política rasteira e a condenava veementemente. Corrupção e autoritarismo são incompatíveis com a conduta cristã.
Seu engajamento, no entanto, não se restringia à censuras. Na condição de Redentor, veio mudar mentalidades. Contra os abusos dos maus políticos, e de outras lideranças oportunistas, Jesus propõe o antídoto da livre e generosa doação. Enfaticamente exige de seus seguidores que se apresentem de forma diferente, seguindo, afinal, seu exemplo. O mais qualificado entre os irmãos deve agir como servidor, atento às necessidades dos outros, independente de remunerações, gratificações e reconhecimentos. Quando os cidadãos, independente de posições e títulos, cumprirem seus deveres e tarefas com responsabilidade, abnegação e denodo, a humanidade experimentará um libertador salto de qualidade na condição de vida. A fé e o seguimento de Jesus carregam a real potencialidade de fazer emergir uma nova e digna sociedade. Fé é também política.
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