sábado, 23 de abril de 2016

ARTIGO: DEUSES

DEUSES Por semanas não se falou em outro assunto além do impeachment. Falou-se muito, mas quem escutou? Persiste o debate, mas quem está se ouvindo? O desafio, agora, não é o parlatório. A urgência é fazer clausura, avaliar com serenidade. Formar opinião livre do clima emocional. A ponderação torna-se tão mais necessária a esta altura, quanto mais forte fica o impulso de gritar. Até mesmo na hora de votar, ficou a nítida impressão de os parlamentares estarem mais preocupados em aproveitar aqueles segundos de exposição para se exibir e defender suas causas que em demonstrar sua compenetração num momento tão grave na atual história do país. Jornalistas internacionais comentaram que o ambiente estava mais para carnaval que para a gravidade do momento. Francamente, o conteúdo de algumas declarações denunciava indigência cidadã atroz! Um desfile absurdo! E o país, além da profunda crise institucional, vive uma situação dramática. Basta conferir a quantidade de estabelecimentos comerciais fechadas. Basta conversar com famílias que começam a enfrentar as carências e os desesperos causados pelo desemprego. A hora não é de fazer demagogia. Independente de simpatias e preferencias político-partidárias, a hora é de olhar o país, compenetrar-se da situação e colocar os interesses da nação acima de qualquer outra bandeira. Comenta-se que o Senado pode arrastar a questão de impeachment até novembro, se todos os recursos forem viabilizados. Insuportável atraso. A angústia aumenta ao constatar que o debate, na eventualidade de uma mudança de governo, continua centrado no fatiamento de cargos: que vantagens e arranjos são possíveis para satisfazer o apetite de partidos e caciques! Falta faz a sensibilidade. Falta enorme faz um genuíno sentimento patriótico! A situação não é de vitória desse grupo e derrota daquele, a situação é de sobrevivência para milhões de cidadãos. E é esta sensibilidade que deve prevalecer em um momento delicado e crítico como este. Ficou patente que o desfecho da votação no Congresso foi impulsionado pelos movimentos da rua. A mobilização popular influiu fortemente na decisão dos congressistas. Ora, é esta mobilização que precisa persistir para os senhores deputados e senadores deixem de lado vantagens pessoais e picuinhas e olhem decisivamente para o bem e o futuro da nação. Pressuposto indispensável para o país respirar e crescer na paz e na ordem,é a união entre os cidadãos. O que se depara, no entanto, é uma tendência crescente para a divisão. Esquenta o clima de ‘nós’ contra ‘eles’, a polarização. O bom senso ensina, amparado na sentença bíblica, que o destino inevitável de uma casa dividida é o desmoronamento. Se persistir a polarização, alimentada por fortes impulsos emotivos, a derrocada não será desse grupo ou daquele outro, mas de todos. Ou se salva o país, ou se afunda! Diante dessa situação dramática, salta naturalmente aos olhos o papel decisivo que cabe às comunidades cristãs. Em sua condição de seguidores comprometidos do Senhor Jesus Cristo, que deixou como principal legado o mandamento do amor fraterno, cabe às comunidades cristãs trabalhar para promover a tolerância e preservar a harmonia. Unidade é diferente da uniformidade. Viver harmoniosamente não tolhe a diversidade de opiniões nem inibe preferências. Insiste apenas no convívio respeitoso e tolerante diante das diversidades. A democracia tem regras e instâncias onde opiniões podem ser formuladas e defendidas. Que se respeite o direito de divergir, sem animosidades. E acima de tudo, sem ódio! Eis a grave ameaça que desponta! Iras e ressentimentos tolhem a serenidade para ouvir e dificultam, óbvio, a capacidade para formular caminhos objetivamente restauradores. Ódios e divisões são os piores obstáculos nesse momento de crise. Apresentam, paradoxalmente, o terreno mais apropriado para uma ação cristã qualificada e restauradora. Somos milhões de cristãos. Está é a hora de mostra nossa verdadeira cara, de revelar o que é realmente prioritário em nossas vidas. Missas, cultos, pregações não passam de ocos rituais se não nos induzirem a trabalhar com afinco para construir a fraternidade, impulsionar a tolerância. Não podemos nos omitir. Nem nos apequenar. Na condição de deuses, pois afinal somos filhos do Deus-amor, reunimos totais condições para promover clima de paz, premissa básica no atual estágio de tensão.

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