AGRADECIDOS

Comece o dia agradecendo! É a recomendação encontrada em praticamente todos os manuais de autoajuda. É uma estratégia bastante útil para alimentar disposições positivas. Analisando bem, são muitos os bons predicados que ornam a vida de cada ser humano. Esses favores costumam ser definidos em linguagem popular como bênçãos. Na condição de dons gratuitos, essas graças exaltam o carinho e o cuidado com que Deus favorece seus filhos amados. Ao reconhecer a gratuidade e abundância dessas bênçãos, a alma humana sente-se motivada a agradecer. A gratidão gera leveza na alma e dilata o coração, predispondo o sujeito a agir com benevolência. O sincero sentido de gratidão não se esgota, todavia, em gestos ou expressões de apreço. Estende-se ao cuidado zeloso das dádivas recebidas e, oportunamente, à sua exposição como forma de ampliar admiração e provocar reconhecimento. A gratidão é naturalmente efusiva! Percebe-se, no atual compasso cultural, que a existência é vista e vivida como se acidente fosse. Está-se vivo por acidente de percurso! Esta visão fatalista reduz dramaticamente a dimensão transcendental da vida. Reduz, igualmente, o apreço pela dignidade da existência. Não se agradece por estar vivo! Consequência triste desta falta de alegria pela existência são as numerosas manifestações de depreciação pela vida em geral. A começar pelo descaso com a natureza. Se de um lado, experimenta-se um salutar despertar ecológico visando a preservação da casa comum, por outro lado, abundam, paradoxalmente, as gratuitas e boçais agressões contra o meio-ambiente. Desgosta profundamente, por exemplo, o acumulo de sujeira na rua, resultado de um elementar descaso, perfeitamente evitável. Impressiona como o cidadão não se apercebe da grosseria de seu desrespeito e como desdenha as trágicas consequências que sua imprudente conduta pode provocar. Por não reconhecer ser a natureza um generoso presente divino, o cidadão a maltrata e a agride em seu próprio prejuízo! Por outro lado, o cidadão que reconhece a gratuidade e a magnificência desta divina dádiva dela cuida. Agradecido por ela zela respeitosamente. A gratidão é naturalmente reverente! Traço outro da atual cultura é o exacerbado individualismo. Difunde-se a equivocada mentalidade de autonomia, amparada pelas mais diversas facilidades de delivery e de serviços on line. Basta o sujeito estar conectado para possuir tudo ao alcance de um click. Esta mentalidade, ao distanciar as pessoas do convívio social, minimiza, obviamente, a importância do semelhante. Na ilusão da autossuficiência, ignora-se o semelhante chegando ao cúmulo de considerar, em algumas situações, que o próximo estorva. Longe de reconhecer a importância do vizinho, e por ele agradecer, o individualista o ignora. A triste realidade é que o outro só é enxergado a medida que presta algum serviço. Consequência outra deste crescente distanciamento é a difusa ênfase sobre direitos e vantagens. Conversas e ocupações focam quase exclusivamente subjetivos lucros, atravancando diálogos e retardando soluções. Neste tenso ambiente, pouco espaço resta para a gratuidade enquanto abundam rabugices, exigências, tédios e impaciências. Nenhuma estranheza, pois, ao verificar a progressiva dificuldade em agendar encontros e promover reuniões. Está ficando sempre mais difícil dialogar em círculos marcados pela intransigência, carregados de pessimismo e de mau humor. Urge corrigir a miopia! Urge mudar de perspectiva! Defeitos há, sem dúvida, e limitações também! Mas há, igualmente, muita virtude, muita beleza, muita capacitação! Falta a sinceridade para enxergar e a humildade para reconhecer! Urge reaprender a gratidão pela existência do irmão. Urge resgatar a benéfica herança legada por gerações de antepassados. O estágio atual de progresso, é sempre bom lembrar, resulta de esforços e trabalhos de inúmeras gerações anteriores. A gratidão inspira humildade. Inúmeros são os motivos para agradecer. Agradecer é valorizar. Valorizar é cuidar. Cuidar é intensificar. Intensificar é multiplicar. Multiplicar bênçãos é o jeito mais concreto de mostrar-se agradecido e a maneira mais eficaz de tornar o cotidiano mais leve e mais descontraído.