sábado, 4 de novembro de 2017

LUTERO

‘É preciso, novamente, fazer perguntas’! Com esta afirmativa, o curador das comemorações da Reforma Protestante, sr. Hasselhorn, resumiu o clima que se pretende criar com as diversas celebrações programadas para marcar o evento. Em 31 de outubro de 1517, o monge agostiniano, Martino Lutero, pregou na porta da igreja da cidade de Wittenberg, 95 definições, contestando pontos da doutrina católica. Esses questionamentos doutrinários abriram o caminho para o segundo grande cisma a atingir a Igreja Católica. Olhando com serenidade os acontecimentos da época, é se induzido a concluir que o impacto da Reforma Protestante não se deveu apenas a questões dogmáticas e morais. Estudiosos há que afirmam não ter sido intenção inicial de Lutero separar-se da Igreja Católica, mas, sim, promover substanciosa reforma a abranger, principalmente, a liturgia e os costumes. O Vaticano promovia na época uma prática piedosa, teológica e moralmente ambígua, a comercialização das indulgências para financiar a construção da basílica de S. Pedro. Lutero, que já vinha interiormente questionando outros temas teológicos, fez desse absurdo o motivo principal da sua desejada reforma, resumida nas famosas 95 teses. Intuindo a possibilidade da tão desejada independência política e econômica, vários estados alemães, saturados em pagar dízimos e impostos a Roma, apoiaram e insuflaram a separação. O que originariamente foi cogitado para ser uma reforma de hábitos na Igreja, evoluiu-se para uma radical ruptura, envolvendo governos e culturas. Com a previsível radicalização de ideais e ideologias, tanto por parte de católicos como de protestantes, o rebanho de Cristo ficou tristemente dividido, apresentando lamentável contratestemunho evangélico! Sob o pretexto de promover o verdadeiro seguimento a Jesus Cristo, sangrentas guerras e ácidos conflitos aconteceram, alimentados por intolerâncias e ódios, sacrificando inúmeras vidas. Total e escandaloso despropósito! As brumas da intolerância, felizmente, estão se diluindo. Vive-se, hoje, o saudável clima de ecumenismo. Principalmente entre as centenárias confissões cristãs. Prevalece o entendimento que são mais numerosos e importantes os valores que unem as confissões de que os argumentos que os mantêm separados. Sugere o espírito evangélico avançar nos pontos de convergência. Para o verdadeiro crente reverbera o profundo desejo do Senhor Jesus Cristo de ver seus seguidores vivendo unidos. Tão íntimo e sacramental este desejo é a ponto do Mestre o apresentar como a mais convincente pregação: ‘que sejam um, como nós somos um, para que o mundo creia que tu me enviaste’(Jo 17,22). Como pode o mundo crer em Jesus se nem quem dizem serem seguidores se entendem direito? A passagem dos 500 anos da reforma protestante, induz o pensador cristão a levantar várias questões, particularmente no estágio atual da chamada erosão da cultura cristã e da explosão da mentalidade materialista e consumista. A mentalidade utilitária que predomina questiona se ainda há espaço para a religião na sociedade atual. Uma serena e imparcial análise da realidade denuncia que o progresso material, por mais encantador, não preenche os anseios mais profundos da alma humana. O material encanta, mas não satisfaz. A alma humana necessita de Deus, mas vai conseguir se convencer desta verdade existencial somente quando encontra comunidades de pessoas que vivem uma real e comprometida fraternidade. A comunhão permanece o testemunho mais eloquente. Mais convincente! O espírito ecumênico não deve apenas envolver teólogos e hierarquia. Deve envolver também todos os batizados. Se o movimento reformista tivesse ficado restrito a questões morais e de comportamento talvez o cisma nem aconteceria. No processo, foi enxertado o debate teológico, o conflito de doutrinas. Ambas as correntes negligenciaram o essencial, o distintivo cristão do amor fraterno. Ideologias dividem. A caridade une, respeitando diferenças! Na reforma, sobraram teses, faltaram caridade e diálogo. Emerge a fundamental pergunta: o que mais comunga com o pensamento de Jesus: o embate sobre dogmas ou o convívio fraterno e respeitoso entre os que se dizem de Cristo?

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