
Periodicamente é preciso revisar conceitos. Tarefa exigente, uma vez que comprovado está que desaprender é mais difícil que aprender! Quando se está habituado a entender as coisas de um jeito, requer-se grande força de vontade, e de humildade, para ajustar conceitos. Basta fazer uma objetiva análise para verificar a força do apego à ideias tradicionais. Ciente da necessidade de um urgente ajuste de conceitos, a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – decidiu consagrar o ano 2018 ao laicato.
A primeira impressão que surge ao usar o termo ‘leigo’, é negativa. Na concepção popular, leigo é um despreparado, sujeito a quem foi impedido de ter acesso a maiores esclarecimentos. Ser leigo num assunto particular acusa falta de instrução. Essa maneira de pensar causou um acentuado distanciamento, uma real divisão na constituição eclesial. Aceitava-se como fato que as comunidades e igrejas sejam divididas entre hierarquia e leigos, assegurando aos primeiros o poder de decisão e relegando os últimos à tarefas subalternas. Ensinada e defendida durante séculos, essa ambígua doutrina criou raízes profundas na maneira do leigo se posicionar na igreja. Se entendia como mero acompanhante, uma presença neutra, cumpridor de rituais, sem nenhuma função relevante na missão da igreja. Graças a uma corajosa e salutar revisão de conceitos, oficialmente assumida pelo Concílio Vaticano II, a realidade do leigo passa por uma substancial guinada. Resgata-se a ideia bíblica do povo de Deus, constituído pelo sacramento do Batismo. Nesta concepção teológica, o povo de Deus é formado por uma identidade comum e uma dignidade radical: todos os batizados são irmãos, filhos e filhas adotivos de um único Pai. O Batismo, comum a todos, é que constitui a família de Deus! Nesta família divina, alguns membros são ordenados ministros com a missão de conduzir, ensinar e administrar sacramentos, sem que esses serviços constituam ou justifiquem ruptura da comunhão fundamental.
Leigos não podem se considerar cristãos de segunda categoria. Nem acomodar-se a um papel meramente coadjuvante. Na atual visão teológica, os leigos recuperam a original dignidade de sujeitos eclesiais, com tarefas e responsabilidades específicas e intransferíveis. Assim como a hierarquia tem seu espaço próprio de atuação, os leigos possuem igualmente seu vasto campo de marcar presença na sociedade. Para resgatar esta fundamental vocação e insistir na evangélica inserção no mundo, a renovada teologia eclesial destaca o ensinamento do Mestre Jesus, conclamando indistintamente os discípulos a serem e agirem como luz e sal da terra. É todo o povo de Deus, hierarquia e leigos, que é convocado a agir no mundo como luz e sal! Ora, tanto a luz como o sal são elementos dinâmicos. Sua presença, embora discreta ou ate imperceptível na maioria das vezes, transforma ambientes. Sem chamar atenção, a luz ilumina e aquece. Igualmente discreto, o sal tempera alimentos ou os preserva da corrupção. Delineia-se assim a ação do leigo nos vários campos do mundo, sua arena preferida. Imbuído de uma firme adesão a Jesus Cristo, a ele configurado, empenha-se em fazer o Cristo reinar e marcar todos os ambientes. É o que se chama de evangelizar, anunciar, não tanto com argumentos, mas particularmente com um coerente exemplo de vida, confiante no vigor da graça divina. No trabalho missionário, não se condiciona a metas cronológicas, tampouco se prende à níveis de produção. A evangelização é sempre trabalho lento, obedecendo a compassos próprios, independente de estatistas e resultados contábeis!
A doutrina é fascinante! Emerge o desafio maior: despertar as leigas e os leigos a ajustarem suas mentalidades e motivá-los a querer ocupar, com eficiência evangélica, seu legitimo espaço. O mundo necessita com urgência que o povo de Deus marque salutar presença.
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