
Religião não se discute! Há muita verdade neste sábio ditado popular. Interpretado superficialmente, o axioma sugere evitar polemizar em torno de preferências religiosas. O que é verdade e aconselhável. Acena, contudo, para uma leitura mais profunda e mais envolvente. Antes de ser matéria de teses, religião, primordialmente, afeta escolhas e preferências. Religião mexe com o cotidiano da vida, com as prioridades e decisões que pautam a conduta dos indivíduos. Religião, de fato, não se discute. Religião se vive! Até mesmo o culto, tantas vezes confundido com a essência religiosa, se não induz a uma progressiva transformação de vida, não passa de um ritual alienante e estéril.
A celebração da Páscoa do Senhor Jesus Cristo oferece preciosa ocasião para uma oportuna reflexão. Cientistas e intelectuais contestam a verdade histórica da ressurreição. Apresentam argumentos biológicos, químicos e físicos a demonstrar cientificamente a improbabilidade do evento ter realmente acontecido. Segundo as leis da ciência e da razão, a ressurreição do Senhor Jesus Cristo é uma ficção, elaborada piedosamente para aclamar mentes e tranquilizar corações. Afinal, que mal há acreditar no paraíso futuro se isso mantém as pessoas resignadas diante das mazelas da vida. A ciência desautoriza a religião! A lógica humana impede que a religião fique em pé! Emerge um fenômeno, no mínimo, intrigante. Como é que uma fantasia, sem nenhum embasamento científico, subsiste, vigorosa e inspiradora, por tanto tempo? Pois ao constatar que a primitiva mensagem da ressurreição foi, originariamente, confiada a um grupo de mulheres e homens, humanamente desqualificados, é de se presumir que a tal fantasiosa ressurreição cairia rapidamente no esquecimento, como tantas outras miragens elaboradas por desajustadas mentes humanas. É se obrigado a concluir, diante dos rigores da história, que a verdade da ressurreição de Cristo não se inclui entre as tantas profecias oportunistas elaboradas por mentes espertas. Alias, ao verificar a original pregação, constata-se a simplicidade e o despojamento do anúncio. Pregava-se, de forma direta e sem mirabolantes raciocínios, a verdade crua e simples: Jesus Cristo, crucificado pelas autoridades da época, encontra-se vivo e ressuscitado.
O vigor da verdade pregada não repousa, evidente, na coerência cientifica da tese nem na qualificação acadêmica dos primitivos mensageiros. Seu poder de convencimento embasa-se no testemunho dado por aquele grupo desqualificado de mensageiros. Ao acreditar na ressurreição do seu Mestre, os primeiros seguidores se convenceram das verdades que ela havia ensinado durante a vida com exemplos concretos e com ensinamentos simples. Em vida, Jesus passou fazendo o bem e ensinando um jeito novo de viver pautado pela caridade, pelo respeito, culminando no perdão das ofensas. Despreocupados em elaborar discursos empolados, os primeiros seguidores dedicaram-se a tornar realidade este novo jeito de convívio, inspirado no radical respeito pelo semelhante, extensivo aos opositores. Ao convidar os ouvintes a acreditarem em Jesus ressuscitado, os primeiros mensageiros chamavam as pessoas a abraçarem a redentora potencialidade desta mensagem. Antes de acreditar em uma tese, a fé na ressurreição instiga as pessoas a largar a indiferença diante do irmão sofredor, a envolver-se na vida comunitária com o intuito de transformá-la. A fé na ressurreição mergulha o crente na história, nos acontecimentos, motivado por uma caridade comprometida, embora desinteressada, capaz de elevar o rumo da história. É esta fé encarnada, que animou e sustentou milhares de seguidores através dos séculos, que dá credibilidade e mantem vibrante o mistério da ressurreição.
Religião não se discute. Religião se vive! É este testemunho da caridade radical que convence quanto à historicidade da ressurreição. A mente cognitiva pode questionar dogmas, mas não encontra argumentos que contestem posturas concretas de caridade transformadora. Crer na ressurreição remonta, basicamente, a seguir o mapa da vida deixado por Jesus Cristo, explorado por multidões de seguidores, e que deixaram formidável herança de esperanças impossíveis de contabilizar!
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