
Irremediavelmente, a cidade de Pisa, na região da Toscana, na Itália, está associada à sua torre inclinada! Tanto para os nativos, como para historiadores, arquitetos e urbanistas, esta identificação, embora constitua o principal motivo de atração para turistas, na realidade, empana o rico legado cultural que a cidade reúne. A torre representa apenas uma obra no conjunto harmonioso que compõe o chamado Campo dei Miracoli – sítio dos milagres – apropriada descrição cunhada pelo escritor italiano Gabriele D’Annunzio, para descrever a imponência da imensa praça central. São quatro edifícios monumentais, cada um com sua beleza, suntuosidade e história que se apresentam ao atravessar a Porta dos Leões: a torre, que no projeto original era para servir como campanário para a catedral, a própria catedral, que lembra a influência moura em Córdoba, na Espanha, o batistério, com sua peculiar pia batismal e o cemitério, conhecido como Camposanto – terra sagrada.
Este último monumento não costuma integrar o tradicional roteiro de visitas à Pisa, centrado obviamente no campanário com a sua atraente inclinação e a imponência da Catedral, dedicada à Virgem Maria. No entanto, este edifício situado no lado esquerdo da fachada da catedral merece muito ser conhecido. Chama atenção a fachada gótica, ornada, em uma das entradas, com um gracioso nicho guardando a imagem de Maria com seu divino Filho. Adentrando o recinto impressiona o imponente claustro, novamente em estilo gótico, onde repousam cidadãos pisanos. O majestoso claustro, decorado por vários afrescos – alguns destruídos na Segunda Guerra Mundial – cerca um retângulo de gramado que, segundo a tradição, se compõe de toneladas de terra trazidas de Jerusalém, mais especificamente da colina do Gólgota, lugar da morte de Jesus! Por causa dessa terra santa, o cemitério recebeu o nome de Campo Santo, terra sagrada. Obvia razão para ser, durante séculos, a cobiçada sepultura da nobreza local. Caminha-se sobre lápides no claustro, ornado nas paredes por nichos e capelas de gente ilustre. Uma das curiosidades guardadas em uma dessas capelas é o famoso candelabro que atiçou Galileu Galilei – o mais notório entre os nativos – a desenvolver sua teoria sobre o movimento pendular. Na época de Galileu o candelabro ficava na catedral. Curiosamente, seu corpo encontra-se sepultado em Florença, cidade tradicionalmente rival de Pisa!
Imponente, o conjunto do cemitério antigo – Camposanto – impõe respeito. Outra razão para visitar o sítio. E nele inspirar-se. Segundo a tradição, os cemitérios passaram a ser chamados de campos sagrados a partir desta construção. Na tradição cristã, os corpos dos batizados são elevados a condição de templos do Espírito Santo, merecedores de maior respeito, mesmo após a morte. Razão porque a liturgia cristã celebra o belo e confortador ritual, conhecido como Exéquias. Na fé cristã, os corpos ressuscitarão para a glória eterna. Razão outra para respeitar túmulos e sepulturas. Lamenta-se, atualmente, a crescente profanação desses espaços sagrados, particularmente nos dias próximos a finados. A oração e o respeito perderam espaço para gargalhadas e comilanças, atitudes vulgares, que ferem sentimentos e profanam espaços sagrados. Mesmo desconsiderando a tradição cristã, basta reparar no respeito e na reverência com que as sociedades revestem os túmulos de seus heróis ou combatentes falecidos, designando ininterrupta guarda sobre seus restos mortais, mantendo, literalmente, acesa a chama cívica.
Todo cemitério é campo santo! Demanda reverência e respeito, tanto para com os falecidos, como também para com parentes e amigos que guardam, saudosos, suas memórias!
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