segunda-feira, 30 de setembro de 2019

AGATHA E NICKOLLAS

AGATHA E NICKOLLAS Que contraste, num final de semana agitado! No Rio de Janeiro, uma menina de oito anos, a caminho de casa, é morta, enquanto sentava em uma kombi ao lado da mãe, por uma balada disparada, ao que tudo indica, por um policial! Desolação total! No outro lado do Atlântico, em uma cerimônia televisionada para o mundo, dona Sílvia Grecco foi aclamada e reconhecida como torcedora símbolo pela FIFA pelo singelo e comovente gesto de narrar a seu filho adotivo, Nickollas, deficiente visual e autista, os lances de jogo de futebol. A sra. Silvia leva seu filho – torcedores do Palmeiras – ao estádio, e numa inspirada iniciativa de inclusão, o ajuda a viver as emoções da partida! O país, enquanto se indigna diante da estúpida morte de mais uma criança, festeja simultaneamente e se emociona perante a comovente dedicação de uma mãe criando ambiente para que seu filho adotivo, deficiente visual e autista, experimente o clima apaixonado de um jogo de futebol! Intrigante contraste! As duas situações, tão diversas, induzem a refletir! Emerge espontaneamente a abissal, mas determinante, distância entre as motivações. O que fez dona Silvia encontrar seu singelo gesto de envolver seu filho nas emoções de um jogo de futebol foi um profundo sentimento de compaixão materna. Amado e adotado com cinco meses de vida, com pleno conhecimento de seu complicado e delicado estado clínico, Nickollas encontrou em dona Sílvia aquela mãe heroica, dedicada integralmente para lhe garantir dignas condições de vida, incluindo a faculdade de vibrar pelo time de coração. Dificuldade alguma a impede de assegurar a Nickollas totais condições de levar uma vida ‘normal’. O fato de ter sido ‘descoberta’ não passa de detalhe, pois, presume-se, mesmo que não fosse descoberta pelo olhar atento de um repórter, continuaria a realizar, de forma anônima, a mesma tarefa. Bondade genuína nunca está associada a notoriedade. Quando se está decidido a fazer o bem, mete-se as mãos a obra e segue-se em frente incondicionalmente! Por outro lado, a trágica morte da menina Agatha denuncia a ambiguidade de uma política de segurança que se pauta pela logística de eliminar bandido. Quando o executivo estimula policial a mirar cabecinha e bang, a probabilidade de se cometerem equívocos irreparáveis aumenta perigosamente. Concede-se, a ousadia e o descaramento dos criminosos é repugnante. Policiais trabalham sob constante tensão! Contudo, deve haver outras abordagens para enfrentar o crime que não seja simplesmente atirar! O básico manual de segurança enfatiza que, em situações onde a vida de cidadãos inocentes estiver em risco, não se deve atirar. O primeiro mandamento de qualquer organização pública é preservar vidas. Louvam-se os muitos agentes que honram seu juramento, até com risco da própria vida! Assiste-se, contudo, a uma explícita e arriscada inversão de tática. Enquanto prevalecer a mentalidade faroeste, alimentada pela facilitação de acesso a armas, protegida por ‘excludente de ilicitudes’, a tendência do agravamento da barbárie recrudesce. Em 2018, o número de pessoas mortas pela polícia ultrapassou os 6000. A licença para atirar transformou a menina Agatha em cadáver e deixou desolada sua família e inúmeros cidadãos indignados! A decisão de valorizar e amar incondicionalmente uma vida totalmente dependente transformou dona Sílvia e o Nickollas em símbolos e inspirações a serem imitados! Que contraste!

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